quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O FB, os adeptos do FB e eu


   Uma amiga confessava-me ontem que, durante a hora de almoço, se rende ao sortilégio do Facebook para descontrair e ir sabendo dos amigos. Quando eu lhe contei que tinha cancelado a minha conta, achei-me na obrigação de tentar explicar porquê. Comecei por me justificar com base na dependência que aquilo cria, no tempo que se perde e no pouco que se retira das fofoquices diárias que por ali gravitam. Mas esta, como outras conversas do mesmo género que já tive com outras pessoas, não ficaria por ali. Porque as pessoas que usam diariamente o Facebook sentem, tal como eu, que precisam de argumentar, de certa forma, para legitimar a sua posição. O mundo em que vivo parece-me às vezes (só às vezes, atenção!) dividido entre os que se renderam ao "Big Brother" e os que conseguem resistir às suas tentações. Então, a minha amiga falou-me da vantagem de manter o contacto com parentes e amigos que vivem longe através do FB, ao que eu contrapus o Skype, mais pessoal e muito menos promíscuo. A cada justificação dela para usar aquilo, vinha a minha boa razão para o dispensar. Andámos nisto uns minutos, até que ela me deu, inesperadamente, a mão à palmatória: «estás quase a convencer-me!». Eu, por outro lado, tentei mostrar-lhe que ainda conseguia ver um lado positivo na coisa: sobretudo a companhia que nos faz, quando estamos sozinhos a trabalhar no computador, a forma como nos proporciona uns minutos de descontracção sempre que precisamos. Mas deixei claro que isso, no meu entender, não compensa os riscos, os dissabores, a irritação que o FB acaba por nos causar, por exemplo quando percebemos que a maior parte daqueles amigos merecem muito pouco tal nome.
   Voltei ao trabalho sem conseguir deixar de pensar no assunto. Senti-me desafiada a tentar convencê-la a cancelar a conta dela no FB, mas ao mesmo tempo repudiei essa ideia por ser estúpida e paternalista (como disse o Saramago, tentar convencer alguém é uma falta de respeito, uma tentativa de colonização do outro). Em vez disso, achei depois mais justo e sensato expressar de forma mais clara e completa a minha opinião, como quem procura esclarecer as coisas para si próprio e, ao mesmo tempo, exorcizar pensamentos nefastos. Eis o resultado: apesar de as pessoas que se recusam a ter um perfil no FB inspirarem o meu respeito e a minha admiração, não posso condenar aqueles que optam por seguir aquela ou outra rede social, como forma de se sentirem ligados ao mundo e em particular às pessoas de quem gostam. Apesar de a mim me desagradar o dilema causado pelos pedidos de amizade de pessoas que não me interessa que saibam o que ando a fazer ou a escrever (que me custa recusar, mas que me abstenho de aceitar), não posso criticar aqueles que conseguem lidar com essa situação com leveza e descontracção, eventualmente seguindo critérios lógicos e eficazes de aceitação e recusa que nunca me ocorreram. Apesar de eu preferir escrever e-mails pessoais aos amigos para saber deles, telefonar-lhes e marcar encontros, não faz sentido anatematizar os que, em vez (ou além) de fazerem isso, também escolhem comer a papinha feita dos feeds constantes que o FB lhes põe à frente dos olhos. E ainda que, pela minha experiência, os conteúdos que aparecem nesses feeds sejam maioritariamente superficiais, desinteressantes e repetitivos, não é impossível que outros utilizadores do FB sejam criteriosos na escolha do que vêem, de tal modo que até aprendem qualquer coisa nova e útil sempre que lá vão espreitar.
Em suma, e quanto à lição que eu posso e devo retirar desta reflexão, é fundamental dar o benefício da dúvida aos que pensamos criticar e, sempre que possível, substituir a crítica pela aceitação. Porque fazer juízos depreciativos dos outros, ou dos seus comportamentos, é tão mau ou pior do que tentar convencê-los a adoptar o nosso ponto de vista.