sábado, 7 de fevereiro de 2015

Terapia



    Supostamente, fazer terapia ajudava. Obrigava-o a fazer, regularmente, as pausas necessárias para analisar os seus sentimentos e atitudes e dava-lhe instrumentos para, reflectindo, poder sair das suas crises pessoais, um passo de cada vez.
    Nos melhores dias, era precisamente isso que sentia. Saía da consulta de cabeça erguida e com passos seguros, animado pela perspectiva de ter food for thought e confiante na sua capacidade para, com aquela orientação profissional, encontrar o caminho para o equilíbrio e a serenidade.
    Naquele dia, porém, depois de ter voltado a sentir-se desesperar com a vida e a sua impotência perante as vicissitudes que ela lhe atirava, ocorreu-lhe que talvez se estivesse a enganar: não teria, com aquela "solução" para os seus problemas, adicionado mais uma forma de pressão às outras que já o angustiavam? A partir de então, cada vez que falhasse, falharia duplamente: primeiro porque não fora capaz de mudar sozinho; depois porque, mesmo com ajuda, continuava a não ser capaz de mudar. Nem sequer sentia que seria uma questão de "falhar melhor", para usar as sugestivas palavras de Beckett. Nas suas circunstâncias estaria, sem dúvida, a falhar ainda pior.
    Iniciar um processo terapêutico era sem dúvida um investimento. Implicava disponibilizar recursos financeiros, temporais e emocionais. E os investimentos, sendo sempre algo que custa fazer, precisavam de trazer algum retorno para poderem ser suportados, para fazerem sentido. Ora, por mais agradáveis que fossem as conversas com o terapeuta, agora, ao sair do consultório, em vez de antever esse tal retorno, o que ele conseguia ver à frente era apenas dispêndio e mais dispêndio - de dinheiro, de tempo, de energia, de ânimo - que motivo tinha para continuar?
    Este era, no momento, o seu drama privado, com o qual ele teria de lidar sozinho, pois era insuspeitado por todos os que privavam com ele. Tinha finalmente decidido, ao fim de tantos anos de hesitação, submeter-se a um processo de psicoterapia e, após dois meses de consultas semanais, sentia-se ainda mais desesperado do que antes.








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