quinta-feira, 30 de julho de 2009

Carta à Escolinha


As despedidas são sempre difíceis, sobretudo quando os momentos passados em conjunto foram muitos e bons.

E a despedida de uma criança que cresceu na Escolinha ainda pode ser mais custosa, pois, como sabemos, não se trata de uma escola qualquer.

No entanto, as crianças são alegria, esperança e sede de futuro. Têm uma capacidade de aceitação que nos deixa muitas vezes perplexos e conseguem ver luz e cor onde nós, adultos, só vemos tristeza. Assim acontece nas despedidas: a minha filha, que eu gostaria de poder manter na Escolinha por mais quatro anos, aceitou a sua saída com um sorriso e soube encontrar argumentos que a confortassem na perspectiva da mudança.

Já eu não posso dizer o mesmo. Fico feliz por ela, está claro, porque vejo que tudo irá correr bem. Mas custa-me muito vê-la sair de uma Escola que fez tanto pela sua boa formação, que lhe abriu tantos horizontes, que lhe proporcionou tanta segurança num espaço tão acolhedor, que a ajudou tanto a sentir-se bem, integrada, feliz.

Actualmente, e por razões que não são as melhores, o papel da escola é fulcral para o futuro não só das crianças como da própria sociedade. Cabe-lhe a difícil tarefa de educar: não apenas transmitir conhecimentos e ensinar a estudar, mas também ensinar a agir, a estar, a escolher, a comer, a viver em grupo, a SER. Porque, afinal, é na escola que elas “moram” durante a semana, desde manhã até ao fim do dia. E a maior parte das escolas vai fazendo o que pode, como pode, porque não tem alternativa.

Mas há escolas que fazem mais do que isso. Há escolas que chamam para si o papel de educadoras porque acreditam que podem, devem e sabem actuar – mas em conjunto com a família, chamando-a à sua responsabilidade – no sentido de construir, com e para as crianças, a sua educação. A Escolinha é disso o melhor exemplo que conheço e é por isso que me custa tanto a despedida.

Ao longo destes anos, fui reparando nas mil e uma preocupações e atenções que na Escolinha regem tudo o que se diz e faz. Fui reparando que nada acontece por acaso, que tudo é cuidadosamente pensado, para que os resultados sejam os melhores possíveis. Fui percebendo como a Directora se dedica de corpo e alma, de forma tão carinhosa quanto sensata, a todos os seus meninos individualmente e em grupo, fazendo-os perceber o que valem, o que podem, o que são, sozinhos e todos juntos. Fui constatando que as educadoras desempenham a sua tarefa com extraordinário entusiasmo, desvelo e profissionalismo. Fui verificando que as pessoas que trabalham na Escolinha se empenham todas, com a cabeça e o coração, na tarefa comum de dar o seu melhor pelo bem das crianças. E constatei, com satisfação, que o bem das crianças não é a consequência fácil de lhes agradar, ou de agradar aos pais. O bem das crianças é, na Escolinha, se a minha interpretação não falha, um estado de harmonia, de bem-estar, que decorre de um conjunto de valores e conhecimentos que as equipam com o que é necessário para serem pessoas responsáveis, íntegras e respeitadoras dos outros. À revelia dos pais, se for preciso, pagando o preço de parecer injusta ou antiquada, a Escolinha aceita as consequências de agir de acordo com as suas convicções. Porque sabe, por experiência comprovada, que vale a pena. Os seus antigos alunos aí estão para dizer «Obrigado, Escolinha».

E eu tenho a certeza de que a minha filha também vai, um dia, saber agradecer o facto de ter sido educada num ambiente em que a ensinaram responsabilizar-se pelos seus actos, a falar a verdade, a pensar construtivamente antes de criticar, a encontrar dentro de si as forças necessárias para vencer a adversidade, a acreditar nas suas capacidades e, também, a ser criança no momento de ser criança – o que é tanto mais difícil quanto vai contra uma sociedade fútil, agressiva e consumista, que impele à mentira, à falta de escrúpulos, à leviandade, e pretende tornar as crianças em “pseudo-adultos” com manias, tiques e caprichos que as tornam frívolas e ridículas.

A Escolinha foi uma excelente escola até para mim. Desde os atribulados dias em que a Madalena lá ficava a chorar, depois de se ter agarrado às minhas pernas a pedir que não a deixasse, até hoje, em que a vou buscar à hora marcada e ela me pergunta, a sorrir, se pode ficar mais um bocadinho...

Os pais não sabem tudo, nem nascem ensinados. Têm defeitos e, por maior que seja a sua boa vontade, por vezes falham na educação dos seus filhos. Nesse sentido, quando por diversas vezes não soube como agir, senti-me guiada e apoiada pela Escolinha, que me ajudou ora a encontrar a melhor forma de proceder, ora a perceber que estava no bom caminho.

Se a Escolinha fez de mim uma mãe melhor – não é exagero –, pode imaginar-se, então, o que terá feito pela Madalena!


É por isso que agradeço a toda a Escolinha, do fundo do coração.


2 comentários:

Alecrim disse...

Nem sei porque é que este texto me comoveu. Acho que eu precisava de ir para a escolinha! ;)

Vida de Praia disse...

Confesso que também fiquei comovida, talvez pela extra dimensão que o esforço e dedicação dessas educadoras proporcionaram à tua filha e que acabaram por enriquecer toda a vossa família. Pela importância e consequências que ficarão para a vida toda de um trabalho bem desempenhado.
Espero que a próxima escola agarre bem a estafeta ;-)
(Ah e ainda o não disse aqui, mas adorei voltar a ver-te estas férias